Sunday, September 25, 2005

Limões azuis

Gosto-te Mar, entre areias e canções perdidas num dourado que aliviou o pesar das coisas menos boas, do preto, do musgo e da pele branca. Gosto-te Mar. Muito. Gosto-te porque, faz sentido, és azul, és vivo e atormentas-me. Gosto de ti, porque encontras e tocas o céu, gosto porque te estendes como tinta numas quantas ilhas de cor terra. Amo-te Armação.

Saturday, September 24, 2005

Desvaneios estranhos e sem sentido

Não são cores, nem são flores, são loucos, são os tutores das nossas dores.

São palavras escuras, que ofuscas, que confundes, que pintas, que não escondes, que rezas. São palavras doces numa rima que brinca, são palavras que não valem a pena escrever, valem a pena viver e respirar, alimentar o que resta de cheio na alma, com harmonia, alegria e outra qualquer palavra que fique bem.
São cores, são flores, são dores, é tudo aquilo que quiseres e não tiveres medo.

Medo. Contra-tempo corajoso, pois é disso que se trata a coragem, ter medo mas avançar.

São divagações, são pincéis, são telas, são ganchos, são virgulas, são texturas, são arranhões, é agua, é areia, é a tua pele morena. Mata-me.
Muito. Mata-me, de novo porque preciso de morrer e perder mais um pedaço de mim. Mata-me, porque a alma não perde o que nunca teve, nem um, nem dois, foram os abraços e que por vezes tão escorregadios como a água, me fizeram sentir fria. Mata-me, porque um cigarro é um cigarro. Mata-me, porque tenho medo. Muito. Se soubesses, o quanto estou a apertar a minha alma, o quanto a voz me falta, o quanto as mãos me tremem, não saberias a agonia suficiente que estou a passar. Mata-me, porque quero morrer, porque estou a sofrer, porque sou demasiado orgulhosa para aceitar um contra-tempo do destino, porque a minha vida era o mais sagrado para mim e deixei que alguém brincasse com ela.
Mata-me, ou diz-me como se faz. Mata-me, porque as lágrimas impedem-me de respirar, porque as dores são demais, porque sou demasiado dependente, porque nada faz sentido. Mata-me, porque senão me matares eu morro.
Pensei duas vezes, pensei mais uma.
Acabou. Acordei.

Thursday, September 22, 2005

Decidi partilhar a minha Alfazema

Já escrevi este pequeno ensaio há algum tempo, a proposito de um concurso literario na minha escolinha. Era-nos pedido que escrevessemos acerca da nossa infância. Assim o fiz, mas como se fosse um rapaz, como em pequena tanto queria ser. Acabei por não o entregar para o concurso, gostei tanto dele que quiz que fosse só meu.

“Alfazema”

Ardia-me o peito. Não sabia se pelo peso do que trazia no bolso da camisa, se pela marca do olhar daquele homem e pela repentina consciência do que sentia por ele, apesar de pouco me lembrar. Era o pai da minha mãe, aquele velho que apareceu de repente diante de mim. Tinha convivido muito com ele, mas o preço da minha infância foi pago em anos sem o ver, agora sentia uma vontade súbita de o abraçar, embora que para mim, ele fosse pouco mais do que um estranho que vagamente me lembrava e tratava por avô.
Era velho e cheirava a alfazema, lembro-me de como passávamos os vermelhos fins-de-tarde de Estio a debulhar milho, e de como ele dividia as suas mãos entre as espigas e o seu cigarro enrolado, de que aliás não prescindia. De como impunha a sua presença junto ao rio, de como me ensinou a pescar, e principalmente, de como era capaz de nos fazer calar em menos de um segundo quando nos beliscava por baixo da mesa com a sua mão quente, suja e calejada.
Memória velhas de um velho, que sempre lutou pelos seus ideais. E como me lembro do brilho daqueles olhos. Grandes, azuis e assustadores, seria capaz de jurar, em pequeno, que estes conseguiam engolir pessoas.
Sinceramente nem me lembro de como comecei esta carta, só me lembro de sentir uma nostalgia melosa, de que não gosto nada, quando o vi numa fotografia antiga. Ah, era linda a forma como se ajeitava para ir à missa todos os dias santos ou de festa e como, quase que meticulosamente compunha o seu cabelo grisalho.
Agora não. Ele estava a olhar para mim, e os segundos pareciam horas eternas que teimavam em não passar, bailando, porém, num cheiro sufocante a baunilha. O silêncio quebrou-se quando ele pronunciou a primeira frase em anos: “Continuas com o mesmo sonho?”. Não respondi, preferi não o fazer, talvez por saber que se o fizesse iria ser alvo de chacota durante os próximos momentos.
Falei, então, quase como uma desculpa do tempo e de como tinha estado bom para navegar. Educado como ele era não me respondeu, mas por sua vez o velho falou horas a fio, parecendo ás vezes cansado, mas uma lembrança recriava-o jovem e forte.
Imaginem, agora, a figura de dois velhos sentados numa mesa de um café rasca, falando por quase uma tarde inteira. Olhei para o relógio, passavam vinte das cinco, levantei-me e deixei o papel que tanto me incomodava em cima da mesa, enquanto tentava arranjar meia dúzia de palavras de despedida. O papel, era um cheque em que tinha a esperança que pudesse apagar o meu passado e apaziguar um pouco a minha consciência. Queria por força pagar todas aquelas tardes de verão, todas aquelas noites estreladas, todos os bolinhos e os chocolates quentes, todos os conhecimentos do campo, todos os sonhos de criança, medos e esperanças, enfim, todas aquelas coisas muito antigas e pouco úteis. O mundo e o país tinham mudado, agora o importante era ser alguém, fazer dinheiro, ter conforto.
Tinha crescido, estudado e agora já era doutor, carro novo, bom emprego, tinha tido algumas discussões com o meu pai, mas nada de sério.
A minha mãe, enquanto foi viva, pouco falou dele. Tinha mágoas por o pai não ter ido ao seu casamento.
Recebi a notícia da doença do velho quase como se fosse um estranho e agora isto, este chamado e este estranho pedido.
Cheguei, pouco tempo antes do combinado. Ele já estava lá, nem sequer me deu tempo de especular ou ficar nervoso ou ansioso, podia ser uma qualquer questão de dinheiro, um pedido de ajuda, achei que mesmo assim que me podia escapar do problema tranquilamente, mas nada nos meus 32 anos de vida confortável, me tinham preparado para o que encontrei lá.
Após toda aquela tarde, vim-me embora. Não consegui dizer nada quando me despedi, a boca seca e o estômago torcido não ajudavam.
Lembro-me de tê-lo visitado, antes de ele falecer, estava no alpendre, com o seu pequeno corpo acomodado na cadeira e sobre o colo a mão inerte, contrariando a força contida naqueles olhos brilhantes. Nessa altura, não soube como me comportar, estendi-lhe a mão, mas o velho apenas acenou com a cabeça indicando-me um banco em frente dele. E ficamos assim, num fim de tarde, com uma caneca de café na mão só a absorver a presença um do outro.
É assim que quero continuar a lembrar-me dele, como um velho, muito velho que cheirava a alfazema e que proporcionou a melhor infância que eu poderia ter tido.

Do teu,
Ricardo Melo
.

Um Rosa fora de estação!

O mundo é cor-de-rosa. É bonito e acolhedor, faz-nos sentir bem, excepto quando é o último dia da tua vida e todo o mal que te circunda parece que é atraído como um íman para ti. Como a forma como perdes o autocarro, num dia de chuva e ainda por cima ficas cheio de lama, te faz duvidar se o que estás a viver não passa de um sonho mau. Ah! Como não gosto do Outono, é frio, molhado, faz-nos andar sempre com um guarda-chuva à coca e um impermeável na mochila.
O que arrefece, são os dias passados na cama com a mãezinha a tratar de nós, o calor de casa e um bom livro acompanhado de um chocolate quente.
Mas o pior, é mesmo, quando nos sentimos depré porque vemos, todo a nossa volta, a mudar, as folhas a cair, a chuva a bater na vidraça e vagamente um puto ou dois a brincarem com uma bola na escola. Isso sim. Rimos, choramos e entramos em stress com a frequência de um espirro dentro de um café cheio de fumo, gente e muito barulho.
Divirtam-se enquanto é Setembro.

Wednesday, September 21, 2005

Porque és Estranho, Surdo e sem Sentido?

Quando a noite escurece e os corvos atacam,
revejo a minha debilidade mental de um espelho partido.
Não vejo nada, vejo tudo, tudo o que me faz falta,
encosto-me ao lavatório de uma casa de banho de um bar qualquer,
e choro, choro muito porque a noite não me corre bem.
Matam-me as saudades de um corpo quase nú,
de beijos que não quero esquecer e de umas mãos quentes,
que me fizeram esquecer quem eu era.

Dancemos?

Numa dança de contra-danças
aonde as alegorias se balouciam com o meu egotismo,
descrevo, talvez, o meu obscuro pensamento que nostalgia
esta ou a tua outra vida.
Quarto cheio de trajes clássicos,
vestidos, saiotes e vodka,
aonde abundam sapatos altos e droga,
que me consomem o resto de alma que me sobra.
Unhas vermelhas, rosto treatral e cabelos falsos,
mentalidade postiça e sombra aparatosa,
quando a pele sombria deixa o que falta desta objectividade.
Aqui não existem romantismos, nem naturezas desiquilibradas,
o que valhe por si é apenas a morte.
Agouros á parte, fica a eloquência da miséria.

Tuesday, September 20, 2005

Maria Papoila, de Seu Nome.

Era Papoila a Maria, e sem saber o que inventar tentou no meio de umas quantas linhas criar uma estória, por si só feita de sonho. Era Papoila a Maria, era-o de feliz no meio de lãs vivas, doces, quentes e carnudas.
Era Vermelha a Maria, assim como a Papoila. E para a Maria, tudo nascia das cores. Azul, Verde, Amarelo, Laranja, Rosa, Púrpura, Lilás, Branco e Vermelho.
Era Vermelha, a Maria, mas ela já o sabia muito antes de o dizer.
A estória da Maria, que sem sendo uma história, foi uma distração para a vista e um deleite para a alma, não por ter muito que contar mas por ter muito mais para sorrir.
E, quando isso acontecia a Maria, era a Maria.
A Maria Papoila que de seu, só tinha a flor de seu nome.